A Ilha das Trevas (III)
PARTE III
«Pensei que tinha ouvido mal, de tal modo era monstruoso o que ele acabara de dizer, e pedi-lhe que repetisse. Com toda a calma, o capitão voltou a dar a ordem, com as mesmíssimas palavras.
“Mata a tua filha.” A Isabelinha e eu ficámos paralisados. “Não posso fazer isso, senhor capitão, não me peça isso”, disse-lhe. Ele respondeu: “Não te estou a pedir, estou a dar-te uma ordem.” Custava-me acreditar que aquela conversa estivesse a decorrer. “Não me mande fazer isso, imploro-lhe, senhor capitão.” Ele insistiu. “Tu andaste ou não nas Hansip?” “Sim, meu capitão.” “Não sabes que um recruta das Hansip faz o que lhe ordenam?” “Sei, meu capitão.” “Então prova que foste das Hansip e que és leal à Indonésia. Mata a tua filha.” “Mas, meu capitão, não sou capaz de fazer isso.” Ele aproximou-se e apontou a arma à cabeça da Isabelinha. “Ouve, estúpido timorense, ouve bem. A tua filha está morta. Cabe-te a ti escolher como. Ou a matas tu com um tiro de misericórdia, ou entrego-a eu aos meus homens e, depois de eles se satisfazerem à tua frente, ela será morta entre os maiores suplícios, e tu também. Como é que preferes?”
Os meus nervos não aguentaram e comecei a chorar como uma criança, abraçado à minha querida filhinha. “Não, não, por favor, Deus que está no céu, por favor, deixem-me com a minha filha, ela não fez mal a ninguém, matem-me a mim mas deixem-na, ela é inocente, ela só sofreu, poupem-na, Nossa Senhora de Fátima nos ajude, Deus sabe que ela nada fez, é apenas uma menininha pequena, a minha filhinha.” O capitão abanou a cabeça, como se estivesse desapontado, e disse-me: “Ela vai ser violada por vários homens à tua frente e depois será cortada aos bocados com uma catana. A seguir será a tua vez.” Vieram uns nangalas e agarraram na menina. A Isabelinha tentou prender-se a mim, eu tentei segurá-la, chorávamos os dois. Mas os soldados tinham mais força e arrancaram-na.»
“Mata a tua filha.” A Isabelinha e eu ficámos paralisados. “Não posso fazer isso, senhor capitão, não me peça isso”, disse-lhe. Ele respondeu: “Não te estou a pedir, estou a dar-te uma ordem.” Custava-me acreditar que aquela conversa estivesse a decorrer. “Não me mande fazer isso, imploro-lhe, senhor capitão.” Ele insistiu. “Tu andaste ou não nas Hansip?” “Sim, meu capitão.” “Não sabes que um recruta das Hansip faz o que lhe ordenam?” “Sei, meu capitão.” “Então prova que foste das Hansip e que és leal à Indonésia. Mata a tua filha.” “Mas, meu capitão, não sou capaz de fazer isso.” Ele aproximou-se e apontou a arma à cabeça da Isabelinha. “Ouve, estúpido timorense, ouve bem. A tua filha está morta. Cabe-te a ti escolher como. Ou a matas tu com um tiro de misericórdia, ou entrego-a eu aos meus homens e, depois de eles se satisfazerem à tua frente, ela será morta entre os maiores suplícios, e tu também. Como é que preferes?”
Os meus nervos não aguentaram e comecei a chorar como uma criança, abraçado à minha querida filhinha. “Não, não, por favor, Deus que está no céu, por favor, deixem-me com a minha filha, ela não fez mal a ninguém, matem-me a mim mas deixem-na, ela é inocente, ela só sofreu, poupem-na, Nossa Senhora de Fátima nos ajude, Deus sabe que ela nada fez, é apenas uma menininha pequena, a minha filhinha.” O capitão abanou a cabeça, como se estivesse desapontado, e disse-me: “Ela vai ser violada por vários homens à tua frente e depois será cortada aos bocados com uma catana. A seguir será a tua vez.” Vieram uns nangalas e agarraram na menina. A Isabelinha tentou prender-se a mim, eu tentei segurá-la, chorávamos os dois. Mas os soldados tinham mais força e arrancaram-na.»
(... CONTINUA ...)
Nota - A parte ente « e » é uma transcrição na íntegra das páginas do livro "A Ilha das Trevas" de José Rodrigues dos Santos.
Nota - A parte ente « e » é uma transcrição na íntegra das páginas do livro "A Ilha das Trevas" de José Rodrigues dos Santos.
Etiquetas: Divulgação
2 Comments:
Caro amigo. Deixo aqui mais este comentário a um post noutro blogue sobre Mangualde que, segundo me pareceu, não foi aceite pelo webmaster. Peço-lhe a sua especial atenção.
Obrigado
A Nunes
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Que a sorte acompanhe estes finalistas. Que trabalho quanto baste já devem ter tido para estarem agora no baile de fim de curso.
Caro amigo, Engº Agnelo (segundo depreendi de comentários anteriores) sempre gostaria de lhe fazer uma pergunta. Veio-me parar às mãos um livro de Samuel Maia , edição de 1917, "Sexo Forte", que se refere, no enredo do romance, a várias terras que eu estou a aventar a hipótese de serem dessa zona de Mangualde e arredores. Fala dum cirurgião de Vilar, Gemalde, Bouças, a fidalga Beatriz, Igreja da sra das Dores, abade da Chamissa, vigário da Curujeira, cura de Fojos, etc. Pelo que investiguei parece-me que a história se terá passado por esses lados. Mas fiquei com algumas dúvidas. Há também um rio perto, e umas termas (zona de Alcafache?)
Peço desculpa pela impertinência deste tema, que até poderá não ser do seu interesse, mas se lhe aprouver informar algo agradecia.
Um abraço
António Nunes
Matos
Este teu post parece que veio, com os acontecimentos desta madrugada (atentados de Ramos Horta e Xanana) relembrar que com ou sem indonésios os timorenses ainda não sabem viver em democracia.
Abraço
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