O meu cantinho!...

Não sou Poeta, não sou Professor, não sou Engenheiro e muito menos Doutor. Sou alguém que aprendeu a ser o que é, porque um dia me disseram que na vida o que realmente importa é ser eu próprio, confiar nos sentimentos e respeitar o que nos rodeia, ...as pessoas e ...o Mundo!

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segunda-feira, fevereiro 25, 2008

Saudade...

Ontem à noite, não estava bem. Apetecia-me tudo e ao mesmo tempo nada, andava às voltas em casa feito barata tonta... foi então que me lembrei de uns velhos amigos, aos quais à muito não fazia uma visita.
Estava uma noite fresca mas com uma "luz" óptima, daí ter saído de casa "armado" com a máquina fotográfica.
Ao sair senti uma suave brisa como que a dar-me as boas vindas,... era a noite, a velha e fiel confidente. Com a saudade no pensamento e as memórias nos olhos caminhei sem rumo... Pouco tempo depois, eles lá estavam, os amigos, mais velhos, mais tristes, mas ainda assim fieis. Acolheram-me com serenidade e por ali andei uns largos minutos, só eu, eles, e a noite, e todos acompanhados pelo silêncio somente entrecortado por um latir aqui ou acolá.
Sentei-me perto de um deles, aquele com quem mais "falei" na minha juventude, aquele que sempre me acolheu nos piores momentos e que esteve/está sempre ali... mais uma vez!
Há sítios realmente especiais,... que não se explicam, apenas se sentem! Deixo-vos algumas fotos... da noite... de um lugar que me preenche de saudades e me dá paz.

Foto CMatos
FotoCMatos
Foto CMatos

Tenham uma boa semana...

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segunda-feira, fevereiro 18, 2008

Rés-Vés

Foto CMatos
Esta expressão é equivalente a «por pouco». Significa que alguma coisa aconteceu por uma margem muito pequena. Por exemplo, quando um estudante passa com a nota mínima, ou quando um clube ganha apenas pela diferença de um golo, diz-se que foi «rés-vés». Há quem utilize a expressão “rés-vés Campo de Ourique”, querendo com isso significar a mesma coisa. Aparentemente, a expressão terá a ver com o que sucedeu em Lisboa, por altura do terramoto de 1775, em que o bairro que tem esse nome foi poupado à destruição, ao passo que a zona baixa da cidade ficou arrasada. Também há quem o atribua ao que aconteceu na batalha de Ourique, onde, segundo a lenda, D. Afonso Henriques, que estava quase a perder a batalha contra os mouros, teve uma visão da Cruz de Cristo com os dizeres «In Hoc Signo Vinces» (sob este sinal vencerás). Animados de nova coragem, os seus guerreiros conseguiram vencer a batalha à tangente, ou, como ainda se diz, rés-vés Campo de Ourique.

A barragem na foto, também está "rés-vés" na sua capacidade, o mesmo não se poderá dizer de todos quantos viram as suas casas e carros serem invadidos pelas enxurradas da madrugada do dia 18. Para com todos eles vai a minha solidariedade, agora também me custa ouvir algumas pessoas a dizer "a minha casa fiou inundada, porque ali atrás está tudo cheio de folhas e entulho e os algerozes entupidos... ninguém limpa nada!"
Então eu se vivesse por ali, e soubesse que a minha vida estava em perigo, não seria minha obrigação ir limpar e providenciar para que a água escorresse o melhor possível? Ou será que vamos esperar de braços cruzados, para depois acusar tudo e todos?
Um exemplo: Eu sei que nos caleiros de minha casa de verão os passarinhos fazem por lá os ninhos e aquilo fica tudo cheio de palha. Logo todos os anos em Agosto/Setembro lá vou eu de vassoura em punho fazer as necessárias limpezas para que a água não transborde para dentro da placa e assim evitar infiltrações!
Há coisas tão simples que poderiam evitar/minorar coisas tão complicadas... porque não as fazer nós próprios? Santo comodismo.

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segunda-feira, fevereiro 11, 2008

A Ilha das Trevas (IV)

PARTE IV

«Foi então que a Isabelinha, Deus é minha testemunha, me disse: “Pai, mata-me tu, por favor, mata-me tu!” Olhei para o capitão, ele fez sinal aos nangalas para pararem e depois ficou a olhar para mim, à espera, como quem diz que esta era a última oportunidade, decide-te agora ou nunca. Olhei para a Isabelinha e ela implorava-me com os olhos que fosse eu a pôr fim ao suplício. E então, Deus me ajude e me perdoe, disse ao capitão que sim.
Um nangala aproximou-se com uma pistola, tirou as balas excepto uma, e entregou-ma. Fiquei a olha para a arma, embasbacado, pensando que aquilo não estava a acontecer, não podia acontecer, sentia tudo irreal. A Isabelinha, liberta das mãos dos nangalas, aproximou-se, abraçou-me, beijou-me, desprendeu-se e pôs os bracinhos atrás do seu pescoço, retirando o crucifixo que tu lhe tinhas enviado semanas antes de Lisboa, e estendeu-mo. “Isto é para a mãe”, disse-me. “Entrega-lhe o crucifixo.” Voltou-se de costas, baixou a cabeça e ficou a aguardar. Não queria acreditar na coragem dela. Então, como num sonho, ergui a pistola, apontei para a nuca, fechei os olhos e fiz aquilo que nunca imaginei que alguém obrigasse um ser humano a fazer. Tinha os olhos embaciados de lágrimas e via tudo turvo. Assustei-me com a detonação e dobrei-me sobre mim próprio, de joelhos, quando o acto ficou consumado. Tinha feito o impensável, o indizível, tinha cometido o maior dos pecados, a maior das vergonhas, submetera-me à maldição eterna.»

Este excerto é retirado de uma carta/confissão que Paulino Jesus da Conceição escreve à sua esposa e que acaba assim:

«E, quando me perguntam o que me fez enfrentar todos estes horrores, o que me fez combater, o que me fez resistir, o que me fez sobreviver, respondo sempre que não foi a coragem, nunca se colocou a questão da coragem. O que me fez estar vivo e enfrentar os bapas foi uma coisa imensamente mais simples. Foi o medo.»

Acabo esta série de posts como comecei apelando para que leiam o romance de José Rodrigues dos Santos, “A Ilha das Trevas”. Esta é a história de “Timor Lorosae”, que continua a ser escrita, face aos últimos acontecimentos com os atentados ao Presidente Ramos Horta e a Xanana Gusmão.
Será que por ali não continuarão as forças obscuras da Indonésia agindo a coberto dos supostos rebeldes?

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sábado, fevereiro 09, 2008

A Ilha das Trevas (III)

PARTE III

«Pensei que tinha ouvido mal, de tal modo era monstruoso o que ele acabara de dizer, e pedi-lhe que repetisse. Com toda a calma, o capitão voltou a dar a ordem, com as mesmíssimas palavras.
“Mata a tua filha.” A Isabelinha e eu ficámos paralisados. “Não posso fazer isso, senhor capitão, não me peça isso”, disse-lhe. Ele respondeu: “Não te estou a pedir, estou a dar-te uma ordem.” Custava-me acreditar que aquela conversa estivesse a decorrer. “Não me mande fazer isso, imploro-lhe, senhor capitão.” Ele insistiu. “Tu andaste ou não nas Hansip?” “Sim, meu capitão.” “Não sabes que um recruta das Hansip faz o que lhe ordenam?” “Sei, meu capitão.” “Então prova que foste das Hansip e que és leal à Indonésia. Mata a tua filha.” “Mas, meu capitão, não sou capaz de fazer isso.” Ele aproximou-se e apontou a arma à cabeça da Isabelinha. “Ouve, estúpido timorense, ouve bem. A tua filha está morta. Cabe-te a ti escolher como. Ou a matas tu com um tiro de misericórdia, ou entrego-a eu aos meus homens e, depois de eles se satisfazerem à tua frente, ela será morta entre os maiores suplícios, e tu também. Como é que preferes?”
Os meus nervos não aguentaram e comecei a chorar como uma criança, abraçado à minha querida filhinha. “Não, não, por favor, Deus que está no céu, por favor, deixem-me com a minha filha, ela não fez mal a ninguém, matem-me a mim mas deixem-na, ela é inocente, ela só sofreu, poupem-na, Nossa Senhora de Fátima nos ajude, Deus sabe que ela nada fez, é apenas uma menininha pequena, a minha filhinha.” O capitão abanou a cabeça, como se estivesse desapontado, e disse-me: “Ela vai ser violada por vários homens à tua frente e depois será cortada aos bocados com uma catana. A seguir será a tua vez.” Vieram uns nangalas e agarraram na menina. A Isabelinha tentou prender-se a mim, eu tentei segurá-la, chorávamos os dois. Mas os soldados tinham mais força e arrancaram-na.»

(... CONTINUA ...)
Nota - A parte ente « e » é uma transcrição na íntegra das páginas do livro "A Ilha das Trevas" de José Rodrigues dos Santos.

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quinta-feira, fevereiro 07, 2008

A Ilha das Trevas (II)

PARTE II

«Fez-se um súbito silêncio. Senti a Isabelinha debaixo do meu braço, soluçando baixinho, e ouvi gemidos a erguerem-se da montanha de corpos que nos rodeava. Mas a minha mãe estava claramente morta. Como me encontrava deitado, não conseguia ver o que se passava à minha volta. Ouvi tiros isolados e os gemidos pararam. A Isabelinha tremia encostada a mim e isso deve ter despertado a atenção de um nangala. O homem aproximou-se e encostou a M16 à Isabelinha. Entrei em pânico. Percebi que a iam executar e não me contive. Gritei “tolong” em bahasa indonésio e ajoelhei-me aos pés do nangala, pedindo misericórdia. O soldado riu-se. Vi um oficial e gritei-lhe que era amigo do major Mubyarto. O oficial, um capitão, aproximou-se e fez sinal ao soldado de que não disparasse. Isso tranquilizou-me ligeiramente. Expliquei-lhe que eu e a minha filha não éramos de Kraras, tínhamos chegado há alguns dias e não tínhamos nada a ver com o que acontecera. Queríamos era regressar a Díli e expliquei-lhe que eu até pertencera às Hansip e era totalmente a favor da integrasi.
O capitão ficou a olhar para mim e para a Isabelinha, que tremia e soluçava. Claramente, estava a avaliar o caso e preparava-se para tomar uma decisão. Quando finalmente quebrou o silêncio foi para me perguntar se eu era mesmo totalmente a favor da integrasi. Respondi-lhe que sim. Perguntou-me como é que podia provar isso. Respondi-lhe que teria de ser o major Mubyato a testemunhar a meu favor. O capitão disse que não conhecia nenhum major Mubyarto e que, de qualquer modo mesmo que ele existisse não estava ali nesse instante para ser consultado. Pareceu-me óbvio que teria de se aguentar até se conseguir falar com ele, mas não me atrevi a fazer a sugestão, poderia ser considerada uma insolência. O capitão insistiu que precisava de uma prova da minha lealdade para com a Indonésia. Fiquei a olhar para ele, sem perceber bem que prova lhe poderia dar. Perguntou-me se estava disposto a fazer tudo pela integrasi. Claro que lhe disse que sim.
Foi nesse momento que ele me disse que matasse a Isabelinha.»

(... CONTINUA ...)
Nota - A parte ente « e » é uma transcrição na íntegra das páginas do livro "A Ilha das Trevas" de José Rodrigues dos Santos.

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terça-feira, fevereiro 05, 2008

A Ilha das Trevas

Foto da capa by CMatosEste é o 1º romance de José Rodrigues dos Santos, que já vai na 5ª edição, e retrata / relata toda a história recente de Timor-leste, desde os longínquos anos de 1975 até 2002, o ano da Independência. Através da leitura deste livro fiquei a conhecer um pouco melhor a história (a triste história) de Timor e dos seus habitantes. Neste livro está tudo aquilo que as televisões e restantes meios de comunicação social "mostraram" sobre o tema, mas tem também algumas (muitas) passagens não relatadas, que nos passaram completamente ao lado, e essas sim, fazem com que todos os acontecimentos façam algum sentido. Acho no entanto um pouco exagerado e despropositado que praticamente todas as narrações relacionadas com personagens Indonésias (políticos e militares) estejam escritas precisamente em Indonésio seguido da necessária tradução em Português. Se a intenção é que aprendamos algumas palavras nesse idioma, para mim é totalmente descabido, face ao que é relatado. Eu de Indonésio apenas gostaria de saber as palavras necessárias para dizer a esses senhores o que em Portugal se costuma chamar a um árbitro de futebol, quando este bem ou mal apita contra a nossa equipa.

Toda a história está centrada na figura de um Timorense, Paulino de seu nome, e da sua família que viveu de bem perto os cerca de 22 anos de ocupação Indonésia.

Aconselho vivamente a leitura desta obra na íntegra, … no entanto e porque me marcou de sobremaneira duas ou três páginas que relatam a vida de Paulino, aqui as vou transcrever por fases.

Nota introdutória: Paulino e sua família (mãe e filha, já que a esposa tinha conseguido fugir para Portugal, e o filho mais novo já tinha morrido nos braços da mãe… à fome) estavam escondidos e refugiados nas montanhas com mais cerca de 500 pessoas. Estavam cercadas, cheias de fome e os megafones dos “bapas” (bapas ou nangalas, assim eram tratados os invasores pelos Timorenses) lá em baixo na cidade apelavam à rendição com a promessa de comida para todos. Claro que os Timorenses desconfiavam, mas naquela altura e naquele estado não havia escolha, os mais fortes fugiram ainda para mais longe, mas os mais débeis…

«Entregámo-nos. A minha mãe e a Isabelinha tremiam de medo, coitadinhas, e eu tentei dar-lhes segurança, ocultando os meus próprios receios. Aproximámo-nos dos nangalas e vi que eram homens do kopassus e de vários batalhões, e incluíam algumas tropas irregulares timorenses. Eles mantiveram as armas apontadas ao nosso grupo, formado por umas quinhentas pessoas, e conduziram-nos em direcção à ribeira Be Tuku, ali perto. Quando chegámos à margem da ribeira, os nangalas pararam e apontaram-nos as armas. De um lado estavam centenas de nangalas, atrás de nós encontrava-se a ribeira. Eu tinha a mão dada à minha mãe e à Isabelinha e percebemos que tínhamos chegado ao fim da linha. Abraçámo-nos com muita força, elas a chorar, eu a beijá-las e a tentar sossegá-las, mas sentia o coração aos pulos, sabia que íamos todos morrer.
Os nangalas abriram fogo de metralhadora sobre nós. Ouvimos o matraquear ensurdecedor à nossa volta, a Isabelinha gritou “pai!” e escondeu a cabeça no meu peito, vi pessoas a cair, à frente, à esquerda, à direita, balas a zumbir por todo o lado, a água do rio a ficar vermelha. A minha mãe foi atingida e embateu brutalmente em mim. Desequilibrei-me e caí com a Isabelinha no chão, os dois sempre muito agarrados, a minha mãe por cima com o sangue a ser despejado em golfadas sobre o meu corpo. Tombaram mais pessoas à nossa volta, algumas também em cima de nós. A Isabelinha chorava e eu rezava a Deus para que aquilo acabasse depressa. Se tínhamos de morrer, que morrêssemos logo, que nos fosse poupada a angústia da espera pelo inevitável. Mas não morremos imediatamente. As rajadas de metralhadora foram perdendo intensidade, até as armas se calarem.»

(... CONTINUA ...)
Nota - A parte ente « e » é uma transcrição na íntegra das páginas do livro "A Ilha das Trevas" de José Rodrigues dos Santos.

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